“O que a gente viu na apresentação de ontem foi o foco na formação para o mercado e num modelo de financiamento absolutamente privatista, sem preocupação com uma formação universitária humanista, questionadora e crítica”, resume a presidente da Aduff-SSind, Marina Tedesco, ao comentar a apresentação do projeto de reforma da educação superior pública federal proposto pelo governo Bolsonaro, o Future-Se.
Ela aponta como a falta de propostas do Future-Se para a Extensão nas universidades denota o descompromisso do governo com o princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, descrito no artigo 207 da Constituição Federal de 1988 e pilar da universidade brasileira. “A Extensão foi mencionada muito de passagem, e não está prevista em nenhuma ação do projeto, ainda que seja num viés privatista que a gente não concorda. Reduzir a universidade à formação de mão de obra especializada para o mercado e relegar ao esquecimento a Extensão, uma dimensão tão importante do projeto de universidade que a gente defende, diz muito sobre esse projeto”, reflete.
“Autonomia financeira” via captação de recursos privados
A docente também destaca “um processo de aprofundamento brutal de ações privatizantes” disfarçado de autonomia financeira das universidades. “Na apresentação do Future-Se, o secretário de Educação Superior (SESU) do MEC, Arnaldo Barbosa de Lima Júnior, afirma que a média de financiamento público das universidades que estão no topo dos rankings é de 40%, sugerindo o que vem por aí. Uma parte do financiamento das universidades brasileiras será pública e o resto teremos que captar! Os departamentos inclusive poderão se tornar Sociedades de Propósito Específico (SPE), modelo de organização empresarial que deturba totalmente a função que um departamento tem hoje, e que certamente não é captar recursos junto a iniciativa privada”, critica.
Professor empreendedor
Durante a apresentação do programa, o secretário do MEC defendeu que “o professor universitário poderá ser muito rico”, já que poderá entrar como sócio ou coautor de start-ups, recebendo dinheiro de patentes e projetos de pesquisas. “Vai ser a melhor profissão do Brasil", afirmou Barbosa de Lima Júnior. Para a presidente da Aduff, a preocupação do projeto em tornar o professor um empreendedor captador de recursos, como já está previsto no Marco Legal de Ciência e Tecnologia, também é um dos pontos chaves do Future-Se.
“Isso significa que os professores com Dedicação Exclusiva (DE) poderão dedicar uma parte do seu tempo – que hoje um ‘40 Horas DE’ dedica para o tripé ensino, pesquisa e extensão - para captar recursos próprios a partir de atividades que sejam de interesse do mercado”, destaca. Para ela, essas medidas privatizantes também virão somadas a uma política de achatamento salarial e de desvalorização da carreira docente. “Já que o professor vai poder captar recurso no mercado, então o governo pode pagar uma remuneração bastante básica e rebaixada. Quem quiser que empreenda e complete seu salário”, analisa.