Ago
07
2019

“O Future-se distorce o conceito de autonomia universitária e poderia se chamar ‘Vire-se’”

É o que defende a professora da Escola de Serviço Social da UFF, Andréa Vale, em seminário organizado pela Aduff para debater o programa do governo

“O Future-se distorce o conceito de autonomia universitária, defendendo a ideia de que autonomia universitária é ‘ter liberdade’ para arrecadar seus próprios recursos. Nesse sentido, o programa poderia se chamar ‘Vire-se’”, destacou a professora da Escola de Serviço Social da UFF, Andréa Vale, em seminário realizado pela Aduff-SSind – nos dias 1 e 5 de agosto - para debater o programa anunciado pelo governo para as instituições federais de ensino.

Para docente, esse é um dos pontos importantes para o enfrentamento ao Future-se, inclusive porque evidencia sua inconstitucionalidade. “O artigo 207 diz que as universidades gozam de autonomia de gestão financeira, e não autonomia para captar recursos”, ressalta. Para Andréa, o programa promove a negação da educação como um direito e tem como objetivo o desfinanciamento das instituições federais de ensino (IFES), com a desresponsabilização do Estado pelo financiamento direto das instituições - e começando por uma política de estrangulamento orçamentário.

Abordando o tema “Future-se e financeirização”, a docente da Escola de Serviço Social da UFF fez uma análise preliminar do programa e apontou como ele articula, em um novo patamar, processos distintos e complementares de privatização, de mercantilização e de empresariamento da educação superior, resgatando alguns processos que já estavam postos na lógica neoliberal e elevando isso a um patamar financeirizado pela presença de uma lógica de financiamento atrelada a fundos de investimentos, instáveis por definição.

“O programa traz elementos anteriores como, por exemplo, as Organizações Sociais (OS), os contratos de gestão, mas articulados numa nova qualidade pela ausência do financiamento estatal e pela transformação do patrimônio das IFES e da União em ativos financeiros, o que vai abrir as portas para o processo de financeirização da educação superior como um todo e, portanto, afetar todo o processo de formação no âmbito das nossas instituições”, alerta a docente.

Andréa Vale defende que a financeirização da educação superior não é um processo meramente econômico, já que o que acontece do ponto de vista econômico invade a totalidade do processo formativo. “Quando a gente fala de empresariar, de mercantilizar, de privatizar, isso muda a orientação do processo pedagógico em si. Muda a natureza da pesquisa, muda a natureza da extensão, muda a natureza do ensino, muda tudo”, explica.

Ela também denuncia o caráter autoritário do programa – lançado pelo governo sem diálogo com as universidades – e aponta que pesquisa e desenvolvimento não combinam com um modelo econômico extremamente recessivo e baseado “no alinhamento incondicional à acumulação, com predominância financeira capitaneada pelos Estados Unidos”.

De acordo com análise da professora da UFF, o Future-se “se relaciona sobremaneira” correspondente a um outro momento da educação superior, “na qual a gente tem, no setor privado, uma lógica extremamente financeirizada e hegemônica que pauta a política educacional em larga escala”. Na avaliação da docente, o Future-se é o programa que quer levar a educação pública para esse mesmo caminho, através de uma refuncionalização radical das universidades públicas.

Para Andrea, o que está em jogo é o caráter público das universidades. “A proposta do Future-se é clara: não virá orçamento necessário para cobrir os gastos das instituições federais. Os cortes já estão dados, não é que eles vão acontecer, eles já estão dados! É a velha estratégica para privatizar e empresariar. Você estrangula e depois lança uma bóia. Quem vê a bóia, se agarra nela com todas as forças”. Na opinião da docente, a tarefa do movimento docente é a de resistir em bloco ao programa que ela caracteriza como “a rapina do patrimônio imobiliário brasileiro”.

“Não dá para desmembrar e salvar alguma coisa do Future-se. Ao mesmo tempo, acho que parte da nossa luta é desentranhar essa lógica competitiva, ranqueada e produtivista que nos assola e já está tão presente nas universidades brasileiras. Só desmontando isso e reafirmando o caráter público, gratuito, laico e socialmente referenciado da Educação, a gente pode desmontar esse discurso empreendedor que grita: money, money, money”, finaliza.

DA REDAÇÃO DA ADUFF | Por Lara Abib

Foto: Luiz Fernando Nabuco

 

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